Aproximadamente 600 mil estudantes, matriculados atualmente no Ensino Médio, têm deficiência auditiva que varia do grau leve a profundo, de acordo com Dados do Censo Escolar de 2015. Isso significa que mais de meio milhão de deficientes auditivos sairão das escolas e ingressarão em breve no mercado de trabalho.
Os números levam a algumas reflexões: de que maneira essas pessoas serão recebidas nas empresas após a conclusão dos estudos? Há demanda em cargos que não sejam operacionais? O mercado de trabalho está preparado para atender as necessidades deste profissional? Como trabalhar com uma pessoa com deficiência auditiva que não oraliza e faz uso da Língua Brasileira de Sinais (Libras)?
Primeiramente, uma breve contextualização: a Língua de Sinais é uma língua viso-espacial com um sistema linguístico próprio e que foi reconhecida em 2002 como língua de comunicação e expressão dos surdos, por meio da publicação da Lei nº 10.432/2002. Ou seja, não se trata de um conjunto de gestos ou de mímicas e, sim, de um idioma. Para aprender Libras é necessário estudo e prática – assim como fazemos para aprender outro idioma na língua oral como o inglês, espanhol, francês.
Outro ponto importante a ser destacado é que nem todo surdo brasileiro se comunica por meio da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Alguns usam, por exemplo, a oralização. Nesse caso, os colegas no ambiente profissional devem se familiarizar com tal forma de comunicação.
Por outro lado, se o indivíduo for usuário da Libras, é necessário que a empresa conte com um Tradutor e Intérprete que possa transmitir suas mensagens àqueles que não compreendem a língua.
De uma maneira ou de outra, o que se observa é que, de forma geral, as companhias não estão preparadas para lidar com deficientes auditivos (DA’s), apesar das normas e dos discursos de inclusão social.
De acordo com o Decreto nº 5.626/2005, as empresas do poder público e privado devem garantir o tratamento diferenciado para as pessoas surdas ou com deficiência auditiva, seja por meio do uso da Libras e da presença do Tradutor e Intérprete de Língua de Sinais, seja por meio de tecnologias que propiciem a garantia a este atendimento:
- § 1o As instituições de que trata o caput devem dispor de, pelo menos, cinco por cento de servidores, funcionários e empregados capacitados para o uso e interpretação da Libras.
Empresas com mais de 100 funcionários devem ter, por obrigação legal, de 2% a 5% de trabalhadores com deficiência. A lei não é novidade, mas muitas empresas patinam na aplicação.
Em uma pesquisa realizada em 2014 pelas empresas Catho e iSocial, com apoio da ABRH (Associação Brasileira de Recursos Humanos), 81% dos profissionais de RH afirmaram que as empresas contratam pessoas com deficiência apenas para cumprir a Lei de Cotas; 49% deles também disseram que as empresas onde trabalham não possuem estrutura ou recursos para viabilizar a contratação de um trabalhador com deficiência. Segundo dados da Secretaria do Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência e do Censo IBGE 2010, 82% dos profissionais com deficiência são contratados sem carteira de trabalho assinada.
As dificuldades enfrentadas pelas empresas para a contratação de pessoas surdas perpassam, inicialmente pela formação deste profissional que, muitas vezes, não teve a oportunidade de adquirir a Língua Portuguesa na fase de alfabetização, como boa parte da população. Vale lembrar ainda que o uso de aparelhos de amplificação sonora individual não garante a comunicação pela Língua Portuguesa, especialmente entre os deficientes auditivos profundos.
Desse modo, os DA’s estão longe de ter acesso às mesmas oportunidades de trabalho que o restante da população, principalmente devido à falta de acessibilidade e de preparo das empresas; ao preconceito existente em relação a qualquer tipo de deficiência; e à falta de especialização ou baixa escolaridade desses indivíduos.
Em grande parte dos casos, essa falta de especialização do trabalhador com deficiência se deve à ausência de acessibilidade nos cursos de formação profissional, uma vez que poucas instituições educacionais fornecem alternativas aos estudantes surdos – como legendagem ou conteúdo em Libras.
Algumas das medidas que devem ser adotadas por empresas quem visam a inclusão do deficiente auditivo no ambiente de trabalho passam pelos seguintes aspectos:
- Identificação do canal correto de comunicação – Libras ou oralização;
- Acessibilidade nos ambientes (físicos e virtuais);
- Disponibilização de Tradutor e Intérprete da Língua de Sinais;
- Estudo da Libras para que os colaboradores da empresa conheçam e difundam o idioma;
A maioria das organizações se preocupa apenas em cumprir a cota, deixando de lado a qualificação dessa mão de obra e intervenções que poderiam melhorar o desempenho desses profissionais no trabalho. Conhecer uma nova língua requer convivência com pessoas fluentes neste idioma. Por isso, é importante que as empresas ofereçam treinamentos in company e/ou cursos rápidos, eficazes e frequentes para os funcionários manterem sempre o contato com a Libras. Só assim veremos na prática a verdadeira inclusão social e a democratizacão da comunicação empresarial.
Cursos recomendados:
- Aprendendo Noções de Libras (Língua Brasileira de Sinais) para Ouvintes
- Aprimoramento de Libras (Língua Brasileira de Sinais) para Deficientes Auditivos